Exposição “Uma Coisa Nunca Vista: João Abel Manta Artista Revolucionário”
Os cartoons e cartazes de João Abel Manta, o mais relevante produtor de imagens no contexto revolucionário, vão estar patentes no Museu Municipal de Arte Moderna Abel Manta, em Gouveia, até 31 de dezembro.
A exposição “Uma coisa nunca vista: João Abel Manta artista revolucionário” reúne o portefólio gráfico e ilustrações do artista numa exposição temática que celebra os 50 anos do 25 de Abril através da iconografia visual associada às campanhas informativas e ilustrações criadas pelo artista entre 1974-1975.
A exposição “Uma coisa nunca vista: João Abel Manta artista revolucionário” poderá ser visitada a partir do dia 25 de abril, no Museu Municipal de Arte Moderna Abel Manta, enquadrada no âmbito das comemorações dos 50 Anos do 25 de Abril em Gouveia.
A exposição dividir-se-á em quatro áreas temáticas: Resistência, Revolução, Memória e Portugal e será a primeira a exibir a obra gráfica de João Abel Manta em torno do eixo da Revolução portuguesa de 1974-75, não se cingindo apenas ao que o artista (nascido em Lisboa em 1928) produziu entre o final de abril de 1974 e o final de novembro de 1975, mas mostrando ainda obra posterior e a obra anterior a 1974 que expressava (e anunciava) o espírito indiscutivelmente contestatário (e revolucionário) de João Abel Manta.
Num conjunto de mais de duas centenas de peças provindas, para além do acervo do Museu Abel Manta, das reservas do Museu de Lisboa e de casa do artista (após uma operação de recuperação de desenhos considerados perdidos e de organização do seu arquivo negligenciado por uma das suas netas, Mariana Manta Aires), o visitante encontrará, além de famosos desenhos e cartazes, verdadeiras surpresas, como uma selecção de desenhos feitos durante os dias passado na prisão de Caxias, em 1948 (nunca antes expostos) e uma série de documentos relativos ao trabalho do artista durante os dias quentes do PREC.
A acompanhar as peças de arte gráfica e plástica, estarão exemplares da imprensa periódica e não-periódica nacional e estrangeira onde o trabalho de João Abel Manta foi sendo impresso ou reproduzido. Serão também exibidas curtas e médias metragens relevantes para o contexto da obra gráfica de João Abel Manta exposta, como a Revolução de Ana Hatherly (1975), Pintura colectiva de Manuel Costa e Silva (1975), A noite saiu à rua de Abi Feijó (1988), O menino crescido que gostava de partir loiça (1992) e A torre de João Abel Manta, o imaginador de Laurent Filipe (ante-estreado na Fundação Calouste Gulbenkian em dezembro de 2022).
A organização destas peças oferecerá a quem as visite um percurso por uma parte da obra de João Abel Manta que prova que ele foi, muito antes de 1974, um artista já plenamente revolucionário, lançando do seu estirador uma “revolução silenciosa” (como escreveu Osvaldo de Sousa) no país vigiado de Salazar e seus continuadores.
Comissariada por Pedro Piedade Marques, a exposição “Uma Coisa Nunca Vista: João Abel Manta Artista Revolucionário” foi organizada exclusivamente para o Museu Municipal de Arte Moderna Abel Manta. A exposição será inaugurada no próximo dia 25 de abril e poderá ser apreciada até ao dia 31 de dezembro de 2024.
Nota biográfica
João Abel Carneiro de Moura Abrantes Manta nasceu em Lisboa a 29 de janeiro de 1928, filho único dos artistas Abel Manta e Maria Clementina Carneiro de Moura Manta.
Começou a expor desenhos na II Exposição Geral de Artes Plásticas da SNBA, em Lisboa, em 1947 (exporia nas EGAPs até 1953). No ano seguinte, em virtude do seu envolvimento nas actividades políticas da secção Juvenil do MUD (Movimento de Unidade Democrática), será preso em Caxias pela PIDE.
Formou-se em Arquitectura pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa em 1951. Com Alberto Pessoa e Hernâni Gandra, foi responsável pelo conjunto habitacional da Avenida Infante Santo, em Lisboa (1952-1955), e, com o primeiro, pelo edifício da Associação de Estudantes de Coimbra (1954-1959), de que também concebeu os painéis de azulejos. Participou na exposição de arquitectura portuguesa em Londres, 1956.
Como desenhador, começou a expor internacionalmente em 1953, na II Bienal de São Paulo, a que se seguiu a Mostra de Lugano (Suíça) “Bianco e Nero” (de 1954 a 1960) e a Bienal de Tóquio (1964).
A partir de meados da década de 1950, começou uma intensa actividade como ilustrador de livros e colaborou com o breve projecto da revista Almanaque (1959-1961).
Em 1961, na II Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian, conquistou o primeiro prémio de desenho (em 1969 ganharia, também para a Gulbenkian, o concurso para a tapeçaria do Salão Nobre).
A sua consagração internacional nas artes gráficas chegou em 1965, na IBA Internationale Buchkunst-Ausstellung, a exposição internacional de artes do livro de Leipzig (RDA), ano em que foi seleccionado para a exposição Graphik aus fünf Kontinenten (Artes gráficas nos cinco continentes) e em que conquistou a medalha de prata. Voltou a ser premiado na IBA em 1977.
No final da década de 1960, começou a colaborar regularmente com o Diário de Lisboa como cartoonista, criando desenhos humorísticos para vários suplementos do jornal, actividade sob vigia permanente da Censura e que só foi interrompida pelo processo movido pelo Estado contra ele e o director do vespertino após a publicação do poster “Festival”, em Novembro de 1972. Sem publicar no jornal em 1974, retomou a colaboração após a Revolução, e, alargando-a a outros jornais (Diário de Notícias, Sempre Fixe, O Jornal), continuou-a até 1978. A sua produção de desenhos para a imprensa até 1975 ficou fixada no álbum Cartoons 1969-1975.
Em 1972, a edição de Dinossauro Excelentíssimo de José Cardoso Pires, com ilustrações suas, tornou-se um sucesso de vendas, após uma acesa discussão sobre o livro entre a ala liberal e os “ultras” na Assembleia Nacional.
No início da década de 1970, começou a expor pintura, actividade que parou logo após a Revolução. Ficou conhecido então também pelas cenografias e figurinos para algumas peças de teatro.
Durante o Período Revolucionário, os seus cartazes para o MFA (Movimento das Forças Armadas) destacaram-se, em particular o “MFA,Povo”.
Após o 25 de Novembro de 1975, reduziu drasticamente as suas colaborações com a imprensa e, em Londres (onde expôs no ICA Institute of Contemporary Arts, em 1976), concentrou-se na criação das Caricaturas Portuguesas dos Anos de Salazar, um álbum que saiu em 1978, para aclamação geral.
Depois da direcção artística e ilustração dos primeiros números do Jornal de Letras, Artes e Ideias, em 1981, pôs um fim à actividade como gráfico e dedicou-se, quase em exclusividade, à pintura.
À sua obra gráfica foi dedicada uma grande exposição em 1992, no Museu Bordalo Pinheiro em Lisboa, e em 2009 a sua obra pictórica mais recente foi exposta no Palácio Galveias.